Visão geral de um estudo típico de interferências


Tubulações, trilhos de trem ou cabos de telecomunicações (aqui referidos como "linhas interferidas") que compartilhem uma faixa de servidão com linhas de transmissão ou de distribuição de energia elétrica CA capturam uma porção da energia presente no campo eletromagnético destas linhas, no ar e no solo. Essa energia capturada, geralmente designada como interferência CA, pode resultar em um risco de eletrocussão para as pessoas que toquem nessas linhas interferidas ou nas estruturas metálicas conectadas a elas, ou ainda que estejam apenas em pé nas proximidades. Além disso, tensões de interferência excessivas através de trilhos, pares telefônicos ou paredes e superfícies de revestimento de dutos podem causar degradação e danos em equipamentos e furos no revestimento dos dutos, levando ao aceleramento da corrosão e a avarias nos isolamentos de flanges e retificadores. No caso de uma elevação drástica do potencial no solo, a própria parede da tubulação pode ser danificada ou perfurada. As tensões trilho-trilho excessivas (diferença de potencial entre os trilhos) podem comprometer a operação normal dos sistemas de sinalização e proteção das ferrovias. O ruído excessivo em frequência industrial induzido nos cabos de telecomunicações pode degradar a qualidade do sinal transmitido.

A interferência eletromagnética causada pelas linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica nas instalações condutoras vizinhas, como gasodutos, oleodutos, adutoras, linhas férreas e cabeamento de telecomunicações, teve um crescimento significativo nos últimos anos. Ela é causada pelo grande aumento dos níveis de corrente de carga e de curto-circuito resultantes da elevação da demanda por energia. Outro motivo para esse aumento dos níveis de interferência tem origem nas preocupações mais recentes com o meio ambiente. Em um esforço de minimizar o impacto da presença de todas essas instalações sobre a vida selvagem e outras ameaças à natureza, o compartilhamento de corredores se impõe.

A causa e o efeito da interferência CA das linhas de energia nas instalações adjacentes são bem entendidos, tendo normas e códigos bem documentados. Para calcular esses níveis de interferência, diversos métodos e softwares foram desenvolvidos. No intuito de reduzir esse efeito a limites seguros, várias técnicas de mitigação foram largamente implementadas. Este documento descreve os métodos e passos essenciais para a realização de um estudo de interferências CA.

A seguir, são descritos os objetivos e as tarefas associadas a um estudo típico da interferência elétrica que ocorre em uma ou mais linhas interferidas devido à proximidade com linhas de transmissão no mesmo corredor.


Objetivos

Os objetivos principais de um estudo de interferências são:

  • Determinar que mitigação é necessária para deixar a interferência eletromagnética nas linhas interferidas abaixo de um nível máximo ao longo de toda a faixa de servidão durante as piores condições de estado permanente. Geralmente, esse nível é de 15 volts, mas pode ser tão alto quanto 50 volts em algumas áreas e tão baixo quanto 10 volts em outras.
  • Desenvolver um sistema de controle do gradiente de potencial para proteger os acessórios expostos, como as válvulas das tubulações, durante faltas na rede elétrica, de acordo com os critérios de segurança especificados na norma IEC 60.479 ou IEEE/ANSI 80. Verificar, ainda, que as tensões de toque nessas instalações sejam inferiores a 15 volts durante os piores cenários de estado permanente. Essa é uma exigência das normas NACE RP0177 e CSA C22.3 nº 6 – M1991. A brochura técnica do CIGRE nº 95 (WG 36.02), de 1995, fornece diretrizes similares. Para linhas férreas, as normas AREMA ou equivalentes devem ser usadas. Normas similares se aplicam a outros tipos de linhas interferidas.
  • Determinar a interferência eletromagnética máxima que ocorre durante uma situação de falta na rede elétrica ao longo das linhas interferidas. As correntes e tensões causadas pela interferência não devem exceder os limites prescritos. Se necessário, projetar a mitigação para reduzir esses níveis de interferência.

Tarefas do projeto

As tarefas relacionadas a um estudo de projeto de mitigação de interferência são:

Configuração do projeto

Coleta de dados e revisão: Forneça uma descrição detalhada sobre dados solicitados para o estudo assim que o trabalho puder ser feito.

Escolha do lugar para as medições da resistividade do solo

Treinamento in loco da equipe para realizar as medições de resistividade e as preparações associadas (se necessário): É importante que a equipe de medição tenha total compreensão dos procedimentos a serem seguidos a fim de obter leituras mais precisas e resolver quaisquer problemas que possam aparecer. A equipe deve usar um instrumento especial para filtrar os ruídos em 50 Hz ou 60 Hz que fluem pela terra ou que sejam induzidos nos fios do medidor pelo campo magnético da linha de energia CA. O acoplamento entre os fios do medidor e entre diferentes peças do equipamento também deve ser minimizado. Além disso, a equipe deve evitar a influência de condutores subterrâneos nus. Tudo isso necessita de um equipamento de teste adequado, de técnicas corretas de medição e de constante monitoramento das medidas para que as anomalias detectadas sejam rapidamente corrigidas.

Medições da resistividade do solo (pela equipe treinada ou por um time qualificado)

Suporte telefônico ou por fax para a equipe de medição: Esse suporte é importante principalmente nos primeiros dias depois do treinamento, quando a equipe pode ter mais dúvidas. Ainda nesse período, as leituras devem ser acompanhadas de perto, para que se identifique qualquer sinal de problema.

Interpretação das medições de resistividade do solo

É importante que as medições sejam transformadas em estruturas de solo com múltiplas camadas para que a interferência condutiva do sistema de aterramento de uma linha de transmissão ou de subestações próximas em falta seja calculada corretamente; assim, os sistemas de aterramento e de mitigação do controle de gradiente podem ser projetados de forma segura e econômica.

Modelo computacional

Um modelo detalhado incluindo tubulações, vias férreas, linhas de energia elétrica, de telecomunicações e instalações associadas (usinas e subestações), além de sistemas de aterramento (ânodos de sacrifício, torre/poste de aterramento), deve ser criado, para que as interações entre todos esses elementos sejam consideradas na determinação dos níveis de interferência por acoplamento indutivo e condutivo nas linhas interferidas. É importante incluir os cabos para-raios, condutores neutros e outras linhas ou condutores metálicos próximos, como as âncoras de estaiamento ligadas aos para-raios, mesmo que não estejam em estudo.

Simulações de carga

Durante as condições de carga da linha de energia, a interferência eletromagnética por acoplamento indutivo constitui basicamente toda a interferência presente, uma vez que a linha interferida é construída: a principal preocupação aqui são os potenciais dessa linha (que levam a tensões de toque e de passo e outras tensões de estresse possíveis). No estudo das condições de carga, é importante considerar um possível desequilíbrio de fase. A influência de correntes harmônicas significativas durante as condições de estado permanente deve ser examinada, se aplicável.

Simulações de falta

Durante as condições de falta, os níveis de interferência condutiva (pela terra), capacitiva e indutiva precisam ser combinados para calcular os potenciais, as tensões transferidas e as tensões de toque e de passo da linha interferida. As faltas devem ser simuladas em intervalos representativos por todo o corredor compartilhado (de preferência, em cada estrutura da linha de transmissão), e as correntes injetadas no solo pelas estruturas da linha de transmissão devem ser consideradas adequadamente. As tensões de toque e de passo devem ser calculadas em lugares representativos por todo o corredor.

Modelos de usinas geradoras e de subestações

Para a estimativa de tensões transferidas através da terra durante condições de falta, pode ser necessário gerar um modelo simplificado dos sistemas de aterramento de qualquer usina ou subestação próxima das linhas interferidas em estudo. Usinas geradoras conectadas diretamente a essas linhas interferidas também devem ser modeladas.

Projeto de mitigação: Cabos de controle do gradiente

Esta etapa determina a extensão necessária dos fios de controle do gradiente de potencial em termos de zonas ao longo do comprimento interferido. As características particulares dos elementos do cabo de mitigação em cada zona devem ser determinadas em função da estratificação do solo local e dos níveis de interferência, como o número de cabos necessários e se o condutor de algum contrapeso de uma torre de transmissão precisa ser realocado ou removido.

Malhas de controle do gradiente para os acessórios expostos

Se necessário, projetos de sistemas de aterramento devem ser elaborados para acessórios de linhas interferidas cujas tensões de toque e de passo continuem excessivas depois de adicionados os cabos de controle do gradiente.

Relatório final

Um relatório final, resumido ou detalhado, deve ser apresentado após a conclusão do estudo. Os principais elementos a serem incluídos são:

  • As estruturas de solo com múltiplas camadas tabeladas a partir da análise da resistividade do solo multicamada.
  • Os gráficos comparando os valores medidos da resistividade aparente do solo com os valores gerados pelo solo multicamada equivalente a partir da interpretação das medições.
  • Os gráficos dos potenciais, das tensões de toque e de passo resultantes da interferência eletromagnética na linha interferida em função da posição ao longo do corredor, para todas as faltas modeladas, com e sem mitigação.
  • Os gráficos dos potenciais, das tensões de toque e de passo resultantes da interferência eletromagnética na linha interferida em função da posição ao longo do corredor, para todas as faltas modeladas, com e sem mitigação.
  • Os gráficos das tensões de toque e de passo da linha interferida resultantes dos efeitos combinados da interferência por acoplamento condutiva (vinda de estruturas próximas de linhas de transmissão em falta) e das interferências por acoplamento capacitivo e indutivo, para lugares representativos, com e sem mitigação.
  • Os gráficos em perspectiva e da vista superior das tensões de toque e de passo associadas a qualquer projeto de malha de controle do gradiente de potencial necessário para os acessórios da linha interferida.

Perguntas mais frequentes

Quanto tempo seria necessário para ter os dados da resistividade do solo ao longo dos 500 km da tubulação e para obter quaisquer outros dados de campo?

Além disso, foi mencionado em algum lugar que as medidas devem ser tomadas com espaçamento de pelo menos 100 m, ou eu entendi mal? A tubulação será paralela e irá cruzar linhas de transmissão de 200 kV e 400 kV por uma distância considerável do comprimento total. Ela também cruzará um número de dutos nos arredores das linhas de energia.

O tempo necessário para fazer as medições da resistividade do solo em toda a tubulação de X km dependerá de vários fatores, incluindo o número de horas diárias dedicadas, a facilidade de acesso ao local, as condições meteorológicas e o terreno. Já vimos uma equipe de duas pessoas completando dois locais de medição por dia, onde cada local necessitava de 15 medições, com espaçamentos de Wenner variando entre 0,5 m e 100 m (entre eletrodos adjacentes). Os lugares são escolhidos onde altos níveis de interferência são esperados, onde há acessórios expostos e em intervalos de aproximadamente 2 km dentro de zonas de interferência ou perto delas, onde o espaçamento real necessário depende do grau de uniformidade da estrutura do solo ao longo da extensão da tubulação.

É preciso escolher bem o resistivímetro, o local exato das linhas de medição e fazer as medições com cuidado, para garantir resultados satisfatórios. A SES pode oferecer suporte nesse aspecto. Desde que os desenhos e dados fornecidos pelas empresas de gás e eletricidade sejam completos e precisos, nenhum outro dado de campo é necessário. Não se pode, entretanto, subestimar a coleta dos dados, uma vez que, com certa frequência, eles são incompletos ou pouco claros, necessitando de esclarecimentos ou até verificações de campo. As medições da resistividade do solo são feitas em um intervalo de profundidades considerável, já que as tensões transferidas para o local das tubulações por torres ou postes de transmissão em falta podem ser muito influenciadas pelas resistividades do solo mais profundo, assim como o desempenho dos longos cabos de mitigação de controle do gradiente; como descrito nas nossas publicações técnicas, a estratificação do solo pode resultar em diferenças de ordem de grandeza nos níveis de interferência por acoplamento condutivo e na performance da mitigação. Ter esses dados permite uma modelagem precisa e, em última instância, um projeto de mitigação econômico.


Ferramentas computacionais

A SES recomenda o uso do pacote CDEGS para a análise e a concepção de projetos associados a estudos de interferência CA. Clique aqui para acessar a árvore de decisão.

Note que o ECCAPP, um software dedicado aos estudos de interferências CA desenvolvido pela SES para a EPRI e A.G.A/PRC em conjunto, é baseado em versões antigas (de 1985) dos módulos MALZ, TRALIN e SPLITS. Atualmente, ele pode modelar apenas solos homogêneos, uma limitação séria em um estudo de interferência condutiva em solos não homogêneos (como resultado, podem ocorrer erros de ordem de magnitude).

Muitos outros softwares utilizados atualmente por alguns consultores também são baseados em hipóteses de solo uniforme. Softwares que apresentem essas limitações devem ser evitados.